Na nossa experiência de trabalho, não raras às vezes, nos deparamos conversando com um produtor discutindo sobre o que deseja deixar de legado, uma herança ou um negócio?
É uma pergunta que pode gerar muito desconforto. Afinal, se eu não me preocupar em vida, deixo para meus filhos e netos que eles resolvam de alguma forma. Nesse momento, pode ser que se entendam, mas também podem ocorrer brigas e/ou conflitos, que irão dilacerar o patrimônio e o negócio, além de arrasar com a família.
Visando te auxiliar neste movimento de estruturação do negócio rural em vida, vou trazer aqui ações que costumamos implementar.
Uma primeira pergunta seria: quando fazer? Bem, com certeza, o melhor momento para tratar isso é em vida, enquanto todos estão bem, o que nos possibilita melhores combinações e acordos que se adequam à sua realidade e aos seus objetivos. Caso contrário, podemos ter que vir a trabalhar com estratégias de redução de danos.
E todas as estruturações de negócio são iguais? Efetivamente não. Os problemas nas famílias são semelhantes? Sim, mas as soluções são diferentes, respeitando a cultura e o jeito de tocar o negócio de cada um. Até porque cada família empresária tem uma história diferente, composição, valores, prioridades e objetivos próprios.
Quando desenvolvemos os projetos de Governança, devemos começar por entender essa história, mapeando com clareza qual a complexidade da família e do negócio. É muito interessante como em algumas reuniões iniciais a emoção floresce quando perguntamos:
• O que é mais importante para nós enquanto Grupo Familiar?
• O que nos faz ter orgulho de nossa família e do nosso negócio?
• Quais princípios nortearam nossas conquistas até o momento?
Após analisar o contexto presente, passam a pensar juntos no futuro:
• Onde queremos chegar?
• O que queremos passar para as gerações futuras?
O desejo é colocar todos na mesma sintonia, alinhados, pensando no negócio como grupo. De forma com que só a partir da identificação deste: onde estamos e onde queremos chegar - podemos organizar a transição, a ponte para atingirmos estes objetivos.
Passa-se então a organizar a arquitetura organizacional do negócio, onde temos a tradição e inovação andando juntas, sempre aliadas. Os valores e o DNA da família empresária são os alicerces, enquanto a inovação vem a agregar valor a um negócio que já vem dando certo.
Na estruturação organizacional se faz necessário definir os órgãos de governança e o organograma do grupo, respeitando a cultura, com clareza, simplicidade e foco na eficiência.
Órgãos de governança
São definidos como uma maneira de estruturar a gestão da empresa rural familiar, e têm como objetivo embasar a gestão diretiva do negócio, gerando estratégias, planejamentos e diretrizes. São os canais formais de comunicação, e devem abranger os três sistemas: família, negócio e patrimônio, visando protegê-los, oferecendo ferramentas que possam organizá-los e facilitar a sua gestão.
Alguns exemplos destes órgãos são: Comitê Gestor, Conselho de Sócios, Conselho de Administração e Fórum Familiar. Cada família empresária tem seus órgãos de acordo as suas peculiaridades e necessidades.
Organograma
É uma representação gráfica simplificada da estrutura organizacional de uma instituição, especificando os seus órgãos, seus níveis hierárquicos e as principais relações formais entre eles (Lacombe, 2003).
Tendo como base o organograma, organizam-se as descrições de cargos, formalizando as atividades e responsabilidades e entregas de todos, agregando organização ao negócio e clareza nas entregas de cada um.
Tais combinações são imprescindíveis numa empresa familiar, imaginem o que pode acontecer quando não está claro o que cada irmão tem que fazer? Vamos somar neste pacote alguns genros e noras? Para dar mais um tempero, como combinar salários nesse contexto? E atenção, pode dar realmente muito certo, se bem organizado.
Sabendo sobre as funções a serem executadas, pode-se analisar o desempenho, gerar maior satisfação e produtividade, e ver os resultados de suas atividades impactando no crescimento do negócio. Possibilitando assim, organizar as remunerações fixas e variáveis de forma clara e justa, tendo como base a meritocracia (valorização por mérito e não por origem). Mantendo foco na excelência do negócio e da harmonia na família.
Nesta linha de combinações, pensando na longevidade, executa-se um acordo familiar, que denominamos de:
Protocolo familiar: um instrumento que expressa a vontade da família empresária, estruturando as atuais gerações e preparando as futuras para que se mantenham unidas e comprometidas em relação ao patrimônio e ao negócio da família.
Ele contém as normas e os procedimentos que regulam as relações familiares, visando manter e reforçar a unidade familiar e o êxito do negócio, bem como, evitar ou resolver possíveis impasses e conflitos.
É um grande momento para a família, de poder sentar e conversar sobre o negócio, fazer suas combinações, gerar engajamento e envolvimento em todos, é o exercício da comunicação proporcionando alinhamento de interesses e afinidade societária.
Como já ressaltamos acima, é fundamental que estejam alinhados quanto as metas como grupo, de forma que podem utilizar as diferentes características de cada um para alcançar os objetivos.
No protocolo familiar discutimos situações como: alinhamento de objetivos, determinação de valores, definições quanto às disposições matrimoniais, sobre prestação de aval e/ou fiança para terceiros, participação de familiares em negócios particulares paralelos ou concorrentes, regramos a entrada no negócio de membros familiares, benefícios veículos, planos de saúde...entre tantos outros pontos.
Em um outro plano, dependendo do estágio que se encontra o negócio, é preciso trabalhar no desenvolvimento de herdeiros e sucessores, para preparar o futuro sócio tanto em questões comportamentais como quanto ao que deve saber sobre o negócio.
Na linha de preparação de sucessores, temos trabalhado na estruturação para sua entrada na empresa, preparando e acompanhando programas de trainee - são programas estruturados (técnicos e comportamentais), com duração prevista e com checagem e reportes para a família e direção do negócio.
Para que um negócio seja estruturado, cabe salientar que isto é um processo e não apenas um ato. Sobre este processo, algumas pesquisas apontam dificuldades nos projetos atingirem suas metas. Diversas são as causas, mas uma característica comum é a pouca atenção dada a um componente: a gestão da mudança, o cuidado com o ser humano e suas peculiaridades (Gonçalves e Campos, 2012). Como atenção, os dois principais pontos que precisam de cuidado são a comunicação e a gestão de conflitos.
Vivemos um momento da história humana onde o que muda é a velocidade com que as mudanças estão acontecendo. Todo o produtor tem consciência desta evolução, prova disso são todas as mudanças que ocorreram nas lavouras em matéria de tecnologia nos últimos anos.
Então, para que você tenha um negócio próspero e estruturado precisamos ter uma estratégia de mudança previamente negociada e participativa, com envolvimento dos membros da família. E não uma mudança impositiva, quando ocorre, por exemplo, a falta de alguém e não há nada organizado para os demais membros da família conseguirem dar sequência sem impactar na continuidade do negócio. Neste momento só resta a adaptação ou a extinção, por não haver uma gestão planejada anteriormente.
Abaixo, trago uma ilustração que mostra a sequência comum das reações humanas diante da mudança. Perceba que mesmo que tenhamos geralmente a passagem por momentos de dúvida e tensão na curva do vale, o resultado após a aceitação tende a ser muito melhor.
Imagem 01. Ilustração da sequência comum das reações humanas diante da mudança.
Considerações finais
Então faço o convite a todos para que transitem pela ponte entre gerações, e que façam o legado durar por décadas. Que sejam os protagonistas, que se engajem e envolvam a todos, de forma a preparar a família empresária para a continuidade.
Portanto, resta a clara importância de planejar, organizar e combinar previamente os pontos relevantes nas relações que envolvem a família, o negócio e o patrimônio. Para que a jornada se dê com harmonia, diálogo e que se consolide o negócio rural da família, valorizando então o legado e o esforço realizado por tantos anos.
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Referências
GONÇALVES, V.; CAMPOS, C. Gestão de Mudanças – O Fator Humano na Liderança de Projetos. Editora Brasport Livros e Multimídeas Ltda. 2012
JOHN FISHER'S Process of Transition Diagram - revised Jun 2012
LACOMBE, Francisco José Masset; HEILBORN Gilberto Luiz José. Administração: Princípios e tendências. São Paulo: Saraiva, 2003.
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por Safras & Cifras - Trabalhando por um Brasil que produz.
Há três décadas, trabalhamos para proteger o maior insumo do agronegócio: A harmonia da família. Especializados no Agronegócio, prestamos Assessoria e Consultoria programando o processo de Sucessão no negócio, implementação de práticas de Governança, e com as ferramentas de Gestão Econômica e Financeira e o Planejamento Tributário fazemos com que a semente plantada com bastante trabalho continue gerando frutos.
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