No atual cenário agrícola, a sucessão entre a cultura da soja e de milho se torna cada vez mais
consistente nas diversas regiões agrícolas brasileiras. Em decorrência da sucessão
milho/soja com a mesma biotecnologia tolerante à molécula de glifosato, a presença de milho
voluntário tem aumentado na cultura da soja e se tornado um desafio no dia a dia dos produtores. Veja a
seguir algumas estratégias para diminuir a presença de milho voluntário no campo.
Estratégias de controle
Uma das melhores estratégias para diminuir a presença de milho tiguera no campo é minimizar as
perdas de colheita através da correta regulagem da colheitadeira, evitando ao máximo a perda de
grãos e espigas. Estes cuidados contribuem para a não germinação dos grãos de
milho que se transformariam em plantas voluntárias e competiriam com a soja.
Todavia, se as perdas na colheita acontecerem, é necessária a adoção de uma medida de
controle químico, como a intervenção com herbicida de mecanismos de ação
diferentes do glifosato – que, neste caso, são os graminicidas.
Desafios
A grande dificuldade em controlar plantas tigueras de milho é que as mesmas apresentam diferentes fluxos de
germinação, ou seja, a frequência e intensidade de emergência variam de acordo com as
condições climáticas de cada região, do sistema de produção, da qualidade
de manejo, condução da lavoura, entre outros.
Imagem 1. Plantas voluntárias de milho em meio a cultura da soja.
De acordo com um trabalho realizado pela Fundação ABC (2012), sobre o potencial de dano da
matocompetição de milho com o gene Roundup Ready™ Milho 2, em lavouras com cultivares de soja
tolerantes ao herbicida glifosato pode ocorrer redução na produtividade da cultura de acordo com o
número de plantas de milho voluntárias por metro quadrado (imagem 1).
Os resultados deste estudo apontaram que a interferência de 1 planta m2, 2 plantas
m2 e 4 plantas m2, representou perdas em produtividade na ordem de 29,8%, 44,5% e 64,4%,
respectivamente, em comparação à testemunha (gráfico 1).
Gráfico 1. Potencial de dano - plantas voluntárias de híbridos com gene
Roundup
Ready™ Milho 2 em lavouras de soja. Fonte: Fundação ABC
As perdas em produtividade são relevantes e, claramente, refletem em impacto econômico para a
propriedade. Além disso, a magnitude dos danos pode ser ainda maior, já que as plantas
voluntárias servem como hospedeiras de insetos-praga e patógenos causadores de doenças que
podem levar a quebra de resistência das biotecnologias no controle de insetos-alvo,
multiplicação de insetos-vetores e doenças.
No caso das plantas voluntárias de milho tolerantes ao glifosato também serem geneticamente modificadas
para resistir ao ataque de insetos – plantas Bt (Bacillus thuringiensis) –,
as mesmas podem exercer elevada pressão de seleção sobre as populações de
insetos-praga que são alvo do controle. Deste modo, a expressão contínua das toxinas
inseticidas ao longo do período de desenvolvimento pode ocasionar resistência às
tecnologias Bt.
As plantas tigueras também são hospedeiras de patógenos que vem causando grandes perdas à
cultura do milho, como por exemplo, os mollicutes causadores de Enfezamento na cultura do milho.
Manejo químico
Dessecação pré-plantio: logo após o início das primeiras chuvas,
o uso de glifosato é primordial para controle de uma gama de plantas daninhas que não apresentam
resistência ao herbicida, contudo, sabemos que a maioria das áreas apresentam biótipos
resistentes a essa molécula, como por exemplo, a Digitaria insularis, Conyza
sp. e Lolium multiflorum.
Além dessas plantas daninhas, também temos híbridos de milho tolerantes ao glifosato, o que
torna necessário o uso de herbicidas específicos para controle das invasoras com resistência
à molécula de glyphosate, como é o caso dos herbicidas inibidores de auxinas
(Conyza sp.) e herbicidas/graminicidas a base de ACCase e, em alguns casos, o uso de produtos de contato
(Carfentrazona etílica, Flumioxazina, Paraquate, etc.).
Entretanto, no Brasil, a legislação proíbe misturas de tanque, o que dificulta a
estratégia para aumentar o espectro de ação dos herbicidas.
Outro cuidado que se deve ter é o antagonismo entre misturas (inibição de um dos mecanismos de
ação), principalmente de latifolicidas com graminicidas.
Pós-emergente: quanto ao controle químico de plantas voluntárias, em
pós-emergência de milho tolerante ao glifosato na cultura da soja com a mesma tecnologia, o manejo de
controle é realizado a base de herbicidas/graminicidas inibidores do sítio de ação
ACCase, que são herbicidas inibidores da síntese de ácidos graxos que atuam paralisando o
crescimento e desenvolvimento celular. Entretanto, esta estratégia, muitas vezes, é ineficiente
dependendo do estádio vegetativo em que se encontra a planta voluntária.
Além do mais, é necessário tomar cuidado com questões como carryover, que são
resíduos de herbicidas que podem comprometer a cultura sucessora; e o uso de subdosagem ou superdosagens de
graminicidas para controlar o milho, pois esta última pode aumentar a pressão de outras plantas
invasoras presentes na lavoura.
As principais moléculas do grupo ACCase estão presentes no quadro 1, com base em
informações oficiais do Ministério da Agricultura, para controle de milho tolerante ao
glifosato na cultura da soja.
Grupo |
Nome Comercial |
Formulação |
Ingrediente Ativo |
Dose Comercial (L.ha-1) |
Solubilidade em Água (ppm) |
Ariloxi - Fenoxi propionatos (FOPs) |
Verdict® R |
EC |
Haloxifope-P-metílico |
0,4 a 0,5 |
9,3 |
Verdict® Max |
EC |
Haloxifope-P-metílico |
0,07 a 0,29 |
9,3 |
- |
EW |
Fluazifope-P-butílico |
0,5 a 0,75 |
1,1 |
- |
EC |
Quizalofope-P-tefurílico |
0,3 a 0,4 |
0,4 |
Oxima Ciclohexanodionas (DIMS) |
- |
EC |
Clethodim |
0,35 a 0,45 |
55520 |
- |
EC |
Tepraloxydim |
0,375 a 0,5 |
430 |
- |
DC |
Setoxidim |
1,25 |
257 |
- |
DC |
Setoxidim |
2,0 |
257 |
EC = concentrado emulsionável / EW = Emulsão óleo em água / DC = concentrado
dispersível
Quadro 1. Principais moléculas do grupo ACCase
Eficiência do controle X estádio fenológico da planta de milho voluntária
A eficiência do controle químico com o uso de graminicidas também está correlacionada com
o estádio fenológico da planta voluntária (imagem 2).
Imagem 2. Eficiência do controle químico
O controle químico é uma ferramenta efetiva e eficaz nos primeiros estádios vegetativos (2 a 3
folhas), sendo que tanto graminicidas do grupo Ariloxi-Fenoxi Propionatos (FOPs) e Oxima Ciclohexanodionas (DIMs)
apresentam eficiência semelhante no controle até o estádio vegetativo.
Gradualmente, quanto mais avançados os estádios, mais difícil o controle das plantas
voluntárias de milho e, consequentemente, maior dose e aumento de custos. Neste caso, os graminicidas FOPs
apresentam maior eficiência em nível de campo, em relação aos DIMs.
Normalmente, estão sendo necessárias 2 aplicações de graminicidas seletivos em
pós-emergência, havendo registros a campo de 3 até 4 aplicações para o controle.
Isto tudo dependente do fluxo de germinação das espigas remanescentes no solo.
Importante destacar que a dose comercial tem suas variações e sempre deve ser determinada de acordo com
o estádio do alvo biológico que se deseja controlar.
Também é necessário buscar por eficiência na aplicação, pois de nada adianta
ter os melhores produtos, melhores equipamentos se não estivermos atentos para parâmetros
básicos como: condições climáticas, tipo de ponta, cobertura de gotas, pressão,
etc. Além dos parâmetros citados, na aplicação de graminicidas, é importante
sempre fazer uso de adjuvantes recomendados pelas empresas fabricantes.
Em suma, o sistema de sucessão soja e milho com adoção da mesma biotecnologia tolerante ao
glifosato é complexo, preocupante e desafiador. A agricultura cada vez mais nos exige
dedicação, conhecimento dos cenários e dinâmicas de manejo. É preciso estar
preparado!
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por Adilson Policena dos Santos Engenheiro Agrônomo pela UFRGS (2006). Possui
experiência em condução de
ensaios a campo em parceria com universidades e fundações de pesquisa para as culturas
do milho, sorgo e soja, geração e desenvolvimento de informações
técnicas e treinamentos e palestras. Atualmente é Supervisor de Serviços
Técnicos para as marcas de sementes da Corteva Agriscience, atuando no estado de
Goiás.
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Publicado em: 16/05/2017
Atualizado em: 02/09/2019
Referências
AGROFIT. Sistemas
de agrotóxicos fitossanitários. Acesso em 20 de maio de 2019.
CONAB. Safra brasileira de grãos. Acesso
em: 06 maio de 2019.
PENCKOWSKI, L. H. Aspectos
importantes no manejo de milho RR voluntário.Acesso em: 20 maio de 2019.