Um dos maiores desafios enfrentados pelos produtores é a escolha da “cultivar perfeita” para cada gleba de sua propriedade. A cultivar escolhida deve atender aos seus principais interesses, que normalmente são: precocidade, resistência aos herbicidas, pragas e doenças, mantendo sempre um alto rendimento e uma perfeita qualidade de grãos. Além disso, a cultivar deve ter alguma flexibilidade de plantio para épocas e diferentes condições de solo e clima.
Devido a essa complexidade, a melhor alternativa é encontrar a “cultivar ideal” para cada região, propriedade ou talhão. Para atender essa necessidade, são realizados testes com diferentes cultivares em diferentes ambientes por vários anos, identificando, desta forma, qual o posicionamento correto a ser adotado para cada cultivar e qual será a mais adequada para cada gleba da propriedade do produtor.
Esses testes são baseados na interação entre o genótipo e o ambiente, resultando no ajuste das melhores práticas de manejo para obter o máximo rendimento e estabilidade produtiva de cada cultivar.
Atualmente, existem várias cultivares recomendadas para cada região produtora de soja do Brasil, sendo que o rendimento destas é resultante da menor ocorrência dos diferentes tipos de estresses durante o ciclo da cultura, ou seja, quanto menor o estresse sofrido pelas plantas durante o desenvolvimento, melhor será seu
Sistema de combinação de cultivares (SCC)
Uma estratégia inteligente na escolha das cultivares é a adoção do Sistema de Combinação de Cultivares (SCC), que visa proporcionar o aumento do rendimento médio da propriedade, combinando cultivares de soja de diferentes ciclos e características.
Neste sistema, as cultivares são divididas proporcionalmente entre os talhões, havendo um menor prejuízo no rendimento caso ocorra deficiência hídrica, excesso de chuvas, ataque de pragas e incidência de doenças em determinados períodos críticos do desenvolvimento da cultura.
Índice de Área Foliar (IAF)
No sistema de produção, deve-se buscar em uma lavoura de soja um Índice de Área Foliar (IAF) entre 4 e 4,5m² para cada m² de área de solo (relação aproximada de 4:1) para que se tenha rendimentos elevados.
O IAF proporciona um aproveitamento de aproximadamente 95% dos raios solares pelas folhas distribuídas nas plantas, o que acarreta no melhor aproveitamento da luminosidade para fotossíntese.
Para se entender melhor a necessidade das plantas de soja e para que se conduza a um excelente sistema de combinação, é preciso observar como eram as características das plantas entre as décadas de 1980 e 1990 em comparação com dias de hoje.
Naquela época, as cultivares se caracterizavam por grupos de maturação maiores (mais tardias) e potencial de IAF que se aproximava de até 8:1 (muito acima do que a cultura necessita). Ao emergirem, sofriam ataques de insetos, o que ocasionava na perda de estande pela ineficiência dos tratamentos de sementes que não possuíam inseticidas.
Além disso, ocorriam perdas de IAF no controle de plantas daninhas, pois os herbicidas apresentavam forte fitotoxicidade à cultura.
Enquanto as plantas se recuperavam, a população de lagartas estava aumentando e com isso se perdia muita área foliar, pois o nível de dano para o início das aplicações de inseticidas, somente era atingido ao apresentar 40 lagartas por batida de pano (recomendação da época).
Assim, o IAF, que iniciava com potencial de 8:1, era reduzido a aproximadamente 4:1, ou seja, a soja era induzida a perder elevadas quantidades de área foliar, restando ainda o suficiente para alcançar produtividades entre 2.400 e 3.000 kg/ha.
Atualmente, as práticas culturais estão direcionadas à redução de perda da área foliar, sendo que as cultivares mais produtivas são as que conseguem desenvolver o IAF em torno de 4:1 no talhão onde são inseridas, utilizando, com isso, toda a energia disponível no ambiente (água, luminosidade e nutrientes).
Para isso, os produtores e os profissionais da área agronômica precisam ter muito “conhecimento” das características das cultivares e, principalmente, do local onde elas serão inseridas.
O manejo ideal da cultura deve ser realizado objetivando a menor perda de área foliar possível, resultando em um IAF próximo aos 4:1 programados. Assim, as cultivares com grupos de maturação menores (mais precoces) e com menor porte (plantas mais baixas) tornam-se mais eficientes em comparação àquelas utilizadas em anos anteriores.
Características e resultados práticos
As cultivares de soja, de acordo com seu ciclo e hábito de crescimento, possuem características diferentes entre elas em relação aos seus potenciais de rendimento em função de diferentes épocas de semeadura, e em diferentes condições ambientais durante cada safra.
É possível observar no gráfico 1 que as diferenças entre as diversas cultivares de soja disponíveis para semeadura em cada região, podem fazer com que as cultivares de um ciclo mais produtivo em um determinado ano não sejam tão produtivas do próximo e vice-versa.
Tudo isso por que dependendo das condições ambientais durante o desenvolvimento da cultura algumas cultivares são favorecidas e outras o oposto, sofrem mais com situações de seca por exemplo.
Gráfico 01. Produtividades de soja de diferentes ciclos e em diferentes épocas de semeadura em dois anos distintos.
Geralmente em anos de maior déficit hídrico as cultivares de ciclo mais curto sofrem mais e ficam favorecidas as cultivares de ciclo mais longo e de maior IAF. O contrário geralmente é observado, se as condições ambientais forem totalmente favoráveis.
A tendência é de que as cultivares de ciclo intermediário para curto se destaquem em produtividade. Isso por que ao final do ciclo, diversas doenças podem acometer a soja, principalmente a Ferrugem Asiática (Phakopsora pachyrhizi) que pode reduzir drasticamente a produtividade.
Gráfico 02. Produtividades de cultivares de soja de diferentes ciclos semeadas em três épocas diferentes, durante o ano safra 2017-2018.
O gráfico 2 nos traz em detalhe o que aconteceu nas diferentes épocas de semeadura no município de Arapoti-PR durante o ano safra 2017-2018.
Na primeira época, que corresponde aos plantios realizados aproximadamente no dia 15 de setembro, as cultivares de soja, de ciclo intermediário, se destacaram em relação a do ciclo mais curto e a de ciclos mais longos.
Quando analisamos a segunda época, que corresponde aos plantios de próximo a 15 de outubro, observamos a tendência das cultivares de ciclos mais longos produzirem mais, o que não é observado na terceira época de semeadura que aconteceu em meados de novembro, quando as cultivares de ciclo mais curto tiveram um desempenho maior. Nesse último caso, provavelmente, as cultivares de ciclo mais longo sofreram uma pressão mais severa de doenças, e por isso a redução de produtividade nos ciclos mais longos.
Gráfico 03. Produtividades de cultivares de soja de diferentes ciclos semeadas em tres épocas diferentes, durante o ano safra 2018-2019.
No gráfico 3 observamos que as produtividades alcançadas não foram tão elevadas quanto às apresentadas no gráfico 2, referente a safra 2017-2018. A explicação para tal acontecimento está nas condições ambientais durante o ciclo da soja na safra 2018-2019, que sofreu com períodos longos de escassez de chuvas somados a temperaturas extremamente elevadas, que atingiu principalmente as cultivares plantadas durante a segunda época.
No gráfico é possível observar o comportamento da primeira época de semeadura semelhante ao ano anterior, sendo que as cultivares de ciclo intermediário se sobressaem às de ciclo mais longo e às de ciclo mais curto.
Na segunda época observamos que as cultivares de ciclo mais longo tiveram maiores problemas em estabelecer maiores produtividades, isso por que essas cultivares foram mais severamente atingidas pelas ondas de calor e pelo solo extremamente seco, do que as cultivares que estavam mais adiantadas (mais precoces).
A terceira época nos mostra claramente a dificuldade que as sojas de ciclo mais curto tem em estabelecer elevadas produtividades em condições ambientais limitantes.
Quando comparadas às cultivares de ciclo mais longo, as cultivares de ciclo mais curto produziram menos, isso por que elas têm um menor período de desenvolvimento vegetativo, e uma maior necessidade de que tudo ocorra o mais adequado possível par atingir elevadas produtividades.
Possivelmente os resultados da safra 2019-2020 sejam superiores aos resultados de 2017-2018 em produtividade, devido ao clima mais favorável dessa safra, e também ao significativo menor ataque de pragas e doenças. Dessa forma, espera-se que as cultivares de ciclo intermediário para curto tenham uma performance superior às cultivares de ciclo longo, primeiro pelo maior aproveitamento da luz, menores índices de acamamento e menor exposição ao déficit hídrico do final da safra.
Considerações finais
As cultivares mais precoces e com porte mais baixo (IAF menor) devem ser utilizadas nas melhores épocas de semeadura, em áreas com baixo risco de deficiência hídrica e com boa fertilidade de solo. Necessário ainda, que sejam adotadas boas práticas culturais, a fim de obter a menor perda possível de IAF.
As cultivares mais tardias e com porte mais alto (IAF maior), por sua vez, devem ser utilizadas nas datas de semeadura fora do ideal e em áreas novas, desuniformes e com fertilidade mais fraca.
Portanto, a adoção do Sistema de Combinação de Cultivares (SCC) permite maximizar o rendimento das diferentes cultivares de soja, diluindo os riscos que não estão sob o controle do produtor – riscos climáticos – e os danos por pragas e doenças inerentes à cada safra, além disso, possibilita a melhor organização na utilização das máquinas agrícolas nas práticas culturais e também no escalonamento da colheita.
Imagem 01. Sistema de Combinação de Cultivares marca Pioneer®.
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por Pergentino De Bortoli
Formado em Engenheira Agronômica pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e atualmente Engenheiro Agrônomo da Corteva Agriscience™ para o PR e SC Alto.
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